Members of the "Warriors of Forest", a vigilante group from the Kanamari ethnic group, patrol along the Javari river in the Javari Valley, in the northwest Amazonas state of Brazil, on May 18, 2023.
Membros dos "Guerreiros da Floresta", um grupo de vigilantes da etnia Kanamari, patrulham ao longo do rio Javari, no Vale do Javari, no noroeste do estado do Amazonas, Brasil, em 18 de maio de 2023. Siegfried / AFP
Briefing 51 / Latin America & Caribbean 20+ minutes

Um problema de três fronteiras: restringindo as fronteiras criminosas da Amazônia

O crime organizado está prosperando na área da selva dividida pelas fronteiras do Brasil, Colômbia e Peru, colocando em sério risco as populações e os ecossistemas do coração da Amazônia. Com a ajuda de doadores, os três países deveriam agir rapidamente antes que a atividade ilegal cause danos irreversíveis.

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[Traduzido do inglês]

O que há de novo? Em toda a região onde o Brasil, a Colômbia e o Peru se encontram nas profundezas da Amazônia, uma variedade de organizações criminosas está explorando o fraco alcance estatal, a abundância de recursos naturais e a pobreza das comunidades locais para crescer, diversificar e criar novos empreendimentos transfronteiriços.

Por que isso é importante? O aumento da produção de cocaína no Peru e a disseminação de outros esquemas, como a dragagem de ouro e a extração ilegal de madeira, ameaçam os modos de vida indígenas, estimulam a violência que resulta em mortes e prejudicam o meio ambiente. Se essas iniciativas criminosas não forem controladas, elas poderão minar o já tênue controle estatal sobre a maior floresta tropical do mundo.

O que deveria ser feito? Dando seguimento às promessas feitas em 2023, os três países deveriam reforçar a cooperação em segurança e mobilizar a ajuda estrangeira com o objetivo de processar e punir os responsáveis por crimes ambientais. O apoio a meios de subsistência legais e uma colaboração mais forte com as comunidades indígenas na linha da frente da expansão criminosa são vitais.

I. Visão geral

Nas profundezas da selva amazônica, a área da tríplice fronteira onde o Brasil, a Colômbia e o Peru se encontram tornou-se um foco de crime, enviando um alerta contínuo sobre as ameaças que a maior floresta tropical do mundo enfrenta. Encorajados pelo controle irregular das autoridades governamentais sobre essa vasta área, grupos criminosos brasileiros estabeleceram parcerias com facções guerrilheiras colombianas e organizações de tráfico de drogas peruanos. Eles exploram uma série de empreendimentos ilegais, desde o cultivo de coca e seu processamento em cocaína até a extração de madeira, a dragagem de ouro e a pesca em áreas protegidas. À medida que as receitas criminosas dispararam, os danos ambientais à Amazônia e a violência infligida às populações locais aumentaram, assim como aumentaram os incentivos materiais para que moradores locais mais necessitados se juntem a um ou outro desses grupos. Para salvar a floresta, forças de segurança dos três países devem deixar de lado a desconfiança mútua, capitalizando o apoio estrangeiro para responder de forma mais eficaz ao crime transnacional. Ao mesmo tempo, a proteção da Amazônia dependerá de garantir que as comunidades locais, incluindo os grupos indígenas, possam buscar meios de subsistência legais e construir uma relação de confiança mais forte com as forças de segurança e nos órgãos estatais.

A crescente influência de grupos criminosos na tríplice fronteira tem provocado um elevado número de assassinatos, muitos deles ligados a disputas por território ou à punição de populações locais que ousam resistir à invasão dessas organizações em suas terras. Nesta parte da Amazônia, o novo senhor ilegal é o grupo brasileiro Comando Vermelho, que ganhou vantagem nas batalhas com dois outros grandes grupos criminosos: o grupo local Os Crías e o Primeiro Comando da Capital, um grupo imensamente poderoso originalmente de São Paulo, mas que agora atua em todo o Brasil. As autoridades policiais acreditam que o Comando Vermelho pode estar em conluio com o grupo guerrilheiro colombiano Carolina Ramírez, que se separou das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), agora desmobilizadas.

O Peru, por sua vez, tornou-se o motor da produção de cocaína na região, causando sérios danos ambientais ao longo da fronteira. As plantações de coca, que são cultivadas em florestas derrubadas, cresceram na província fronteiriça peruana de Mariscal Ramón Castilla, muitas vezes financiadas por investidores colombianos ou brasileiros e utilizando a mão de obra de moradores locais para cultivar a planta. A folha é processada em laboratórios que vazam contaminantes no solo e na água e, em seguida, o produto final é transportado em grande parte sem qualquer controle ao longo do Amazonas e seus afluentes. A maior parte acaba sendo vendida no Brasil – o maior mercado interno para a droga na América do Sul – ou exportada para a Europa e África. Parte dela passa pelo Equador, o país que atualmente sofre os piores índices de violência criminal da América do Sul.

Os grupos ilegais frequentemente reinvestem os lucros do tráfico de droga em outras atividades prejudiciais ao meio ambiente.

A pouca resistência das autoridades a esse fluxo é prontamente eliminada por meio de subornos ou violência. Os grupos ilegais frequentemente reinvestem os lucros do tráfico de droga em outras atividades prejudiciais ao meio ambiente, como a extração ilegal de madeira, a dragagem e a pesca, o que lhes permite “lavar” sua renda e gerar ainda mais. As comunidades indígenas têm procurado defender os seus territórios das incursões de grupos criminosos, mas muitas afirmam não ter recebido apoio do Estado ou das forças de segurança. As chamadas tribos indígenas não contatadas, ou povos isolados, correm um risco particular com o aumento da criminalidade. Essas comunidades vivem nas profundezas da selva, tendo evitado a interação com a civilização ocidental durante séculos. O perímetro ininterrupto do seu território, que é protegido por lei, está prestes a ser violado por madeireiros invasores, grileiros e outros criminosos, ameaçando não somente sua cultura, mas também sua própria existência.

O papel essencial desempenhado pela Amazônia na regulação do clima mundial é universalmente reconhecido. Certamente ocupará o centro das atenções nos principais encontros internacionais sobre meio ambiente que ocorrerão em breve na Colômbia e no Brasil, a COP16 da Biodiversidade em outubro de 2024 e a COP30 do Clima em 2025, bem como na cúpula do G20 no Rio de Janeiro em novembro.

No entanto, sem um maior compromisso com a proteção da Amazônia e de seus povos por parte dos três países fronteiriços, o crime organizado continuará a desencadear a violência, a prejudicar a floresta tropical e a desestabilizar a sociedade. Os imensos ativos naturais da região só podem ser preservados se as proteções forem devidamente aplicadas e as regras de utilização da floresta respeitadas, em vez de serem subvertidas pela propagação da atividade criminosa. É crucial fortalecer a cooperação entre os órgãos de segurança pública dos três países fronteiriços, bem como entre os seus parceiros estrangeiros. Essa é a única forma viável de identificar, processar e, quando necessário, punir os grupos criminosos e os financiadores responsáveis pelos maiores danos à população local e ao meio ambiente. Além de uma maior coordenação transnacional, as forças de segurança também precisarão contar com o apoio e o conhecimento local das comunidades indígenas e, ao mesmo tempo, aumentar o número de meios de subsistência legais à disposição delas. Com o apoio de doadores estrangeiros, Colômbia, Brasil e Peru devem agir rapidamente antes que o crime cause danos irreversíveis ao coração da Amazônia.

Os grupos do crime organizado estão cada vez mais ativos ao longo dos principais rios que atravessam a floresta amazônica no Brasil, Colômbia e Peru, inclusive em territórios indígenas e áreas ambientalmente protegidas. Fonte: RAISG, OSM / CRISIS GROUP

II. Grupos criminosos nas regiões fronteiriças

O isolamento da Amazônia é tanto sua característica mais preciosa quanto seu maior risco. A região onde Brasil, Colômbia e Peru se encontram está particularmente distante de áreas populosas. Com suas últimas fronteiras demarcadas apenas na década de 1920, a região da tríplice fronteira fica a milhares de quilômetros das respectivas capitais desses países, o que é uma das principais razões pelas quais a sua vida selvagem proliferou e os recursos naturais continuam abundantes.[1] Ao mesmo tempo, as oportunidades que a área oferece para a obtenção de lucros ilícitos estão atraindo cada vez mais a atenção de poderosos grupos criminosos, sobretudo no Brasil.


[1] O tratado Salomón-Lozano de 1922 entre a Colômbia e o Peru visava resolver antigas disputas de fronteira em áreas dominadas por barões da borracha. Neste tratado, o Peru cedeu a soberania de Letícia à Colômbia, concedendo a esta última acesso ao rio Amazonas, e manteve o controle das terras até a margem direita do rio Putumayo. Em 1932, no entanto, a insatisfação peruana com o tratado estimulou um esforço para tomar o controle de Letícia, desencadeando uma guerra colombiano-peruana que durou oito meses. A Liga das Nações desempenhou um papel crucial na mediação do conflito e facilitou a transferência de Letícia de volta para a Colômbia em 1933. Para mais informações, ver Yohana Pantevis e Germán Palacio, Ciudades amazónicas intermedias, pesca y frontera (2016). Andrea Díaz Cardona, ‘El conflicto de Leticia’: cómo fue la guerra entre Perú y Colombia por un pequeño territorio (y quién ganó)”, BBC, 26 de maio de 2023.

Como a região da tríplice fronteira não tem estradas transitáveis, pequenos barcos são o principal meio de transporte público. Letícia, Colômbia, 2024. CRISIS GROUP / Bram Ebus

A. Os recursos da Amazônia

A região da tríplice fronteira abriga comunidades isoladas que têm monitorado, nutrido e protegido a floresta. Os povos indígenas – incluindo os Ticuna, Bora, Marubo e Matis – residem em aldeias e assentamentos rurais ao longo do Amazonas e seus afluentes. Os serviços governamentais nessas cidades são praticamente inexistentes. Os habitantes locais dependem de geradores movidos a gasolina para obter eletricidade intermitente e não há hospitais a menos de um dia de viagem para muitas comunidades remotas. Nas profundezas da floresta, vários grupos indígenas, como os Mayoruna e os Tsohom Dyapa, vivem em isolamento voluntário.[1] Um influxo de novos residentes, turistas e membros de grupos criminosos representa graves ameaças a essas populações nativas, trazendo novas doenças e a ameaça de violência.[2] Os principais centros urbanos da região, por sua vez, são as cidades gêmeas de Tabatinga e Letícia, na fronteira entre o Brasil e a Colômbia, as quais praticamente se fundiram em uma única aglomeração com cerca de 113.000 habitantes.

A falta de estradas transitáveis significa que a região da tríplice fronteira só é acessível por barco ou avião. A escassez de negócios legítimos e a ausência de uma presença estatal robusta, ambas decorrentes do isolamento da área, tornam os empregos escassos, enquanto a atividade ilícita prospera.[3] As taxas de pobreza e de homicídios na área são muito superiores às médias nacionais, mas como a região é composta por zonas rurais e pequenas cidades, as autoridades nacionais tendem a ignorar os surtos de violência nesse local.[4] Os funcionários dos órgãos de segurança pública da região, que são principalmente encarregados da segurança das fronteiras, reclamam de que não dispõem dos recursos e equipamentos necessários para realizar o seu trabalho.

O papel da Amazônia na regulação climática torna a insegurança na região da tríplice fronteira uma preocupação global. Como a maior floresta tropical do mundo, a Amazônia funciona como um importante sumidouro de carbono, absorvendo quantidades substanciais de dióxido de carbono atmosférico. Por meio de seu papel central no ciclo hidrológico, a Amazônia também exerce uma profunda influência nos padrões globais de clima e precipitação. Sua incomparável biodiversidade é essencial para manter o equilíbrio ecológico.[5] Mas o crime organizado cobra um preço alto à medida que se espalha pela Amazônia alimentando a violência, desestruturando comunidades e promovendo o desmatamento e outros tipos de degradação ambiental. Em conjunto, os danos à natureza e às vidas humanas causados pela atividade criminosa também tornam mais difícil para os países da região preservar o ecossistema e a sua capacidade de mitigar o impacto das alterações climáticas.


[1] Especialistas dizem que há cerca de dezenove grupos indígenas isolados voluntariamente. “Vale do Javari: la presencia del Estado aseguró la paz por muchos años”, Agência Brasil, 27 de fevereiro de 2023.

[2] Uma chegada recente é um culto cristão conhecido como os Israelitas, o qual estabeleceu vários assentamentos na floresta amazônica. Para mais informações, ver Ivan Brehaut, ““Los Israelitas del Nuevo Pacto Universal en el Perú: religión, deforestación y narcotráfico”, La Mula, 14 de agosto de 2023; e Dom Phillips, “The isolated tribes at risk of illness from Amazon missionaries”, The Guardian, 23 de março de 2020.

[3] O departamento do Amazonas, na Colômbia, apesar de estar ligado a importantes rios utilizados para transporte, representa apenas 0,1% do PIB nacional. “La información del DANE para la toma de decisiones regionales”, Departamento Administrativo Nacional de Estatística, maio de 2022. No Brasil, o estado do Amazonas representa apenas 2% do PIB nacional, apesar da zona de livre comércio em Manaus e de muitas indústrias extrativas. “Economia do Amazonas”, Brasil Escola.

[4] Bram Ebus e Ulrich Eberle, “Crimes against the Climate: Violence and Deforestation in the Amazon”, Crisis Group Commentary, 8 de dezembro de 2023. Dados coletados pelo Crisis Group a partir de bancos de dados policiais nacionais no Brasil, Colômbia e Peru.

[5]Amazon Assessment Report 2021”, Painel Científico para a Amazônia, 2021.

B. Concorrência criminal

O aumento da violência e a degradação ambiental são o resultado da expansão de grupos criminosos para as remotas selvas amazônicas, particularmente por parte de organizações brasileiras que, até uma década atrás, operavam principalmente em centros urbanos. De longe, a organização criminosa dominante é o Comando Vermelho, que surgiu no presídio Cândido Mendes, no Rio de Janeiro, e foi fundado por Rogério Lemgruber há quase 50 anos. Juntamente com a poderosa organização criminosa nacional Primeiro Comando da Capital (PCC), esse grupo ampliou seu alcance para cidades no coração da Amazônia e agora aparentemente também opera na Colômbia e no Peru. O grupo também estabeleceu uma base de poder nas prisões de Letícia e Tabatinga, supostamente com o apoio de autoridades corruptas.[1]

Em suas incursões na Amazônia, o Comando Vermelho e o PCC seguiram o exemplo da Família do Norte, um grupo originário de Manaus, capital do estado do Amazonas, que foi a principal organização criminosa local por quase uma década. No final dos anos 2000, a Família do Norte estabeleceu laços com guerrilheiros colombianos e traficantes de drogas no Peru para se tornar o principal comprador de coca peruana ao longo do rio Amazonas.[2]


[1] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, presidiários, Tabatinga, novembro de 2023.

[2] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, presidiários e autoridades policiais, Tabatinga, novembro de 2023. Em 2023, mais de duas dezenas de prisioneiros, incluindo cidadãos brasileiros, foram enviados de Letícia para Bogotá para evitar que organizassem uma revolta. Entrevista conduzida pelo Crisis Group, funcionários públicos, Bogotá, 5 de junho de 2024.

Gangues brasileiras, como o PCC de São Paulo, que se originou longe da Amazônia, já entraram em cidades fronteiriças colombianas e picharam muros. Letícia, Colômbia. Janeiro de 2024. CRISIS GROUP / Bram Ebus

Há quase cinco anos, apesar de uma aliança anterior, o Comando Vermelho desafiou com sucesso o domínio da Família do Norte quando lançou um novo empreendimento conhecido como Comando Vermelho Amazonas. (Um chamado Conselho Permanente de treze membros em Manaus supervisiona esse empreendimento. Essa entidade, por sua vez, responde à liderança da gangue no Rio de Janeiro. [1]) Em meados de 2023, derrotou não apenas a Família do Norte, mas também outro de seus principais concorrentes na região da tríplice fronteira, Os Crías. Essa gangue era um desdobramento da Família do Norte: ex-membros da Família do Norte – junto com novos recrutas locais – a fundaram em 2019. Os Crías receberam financiamento inicial e armamento do PCC, com o entendimento de que, juntos, os grupos contrabalançariam a influência do Comando Vermelho e ganhariam o controle das rotas de tráfico.

Esse plano não deu em nada devido à falta de disciplina nas fileiras de Os Crías. “Eles são jovens, entre quinze e dezesseis anos, até vinte anos, [e a organização] não tinha uma estrutura muito forte e bem desenhada”, explicou um investigador da polícia brasileira. A certa altura, disse ele, essa organização criminosa tinha um líder proeminente “que lhes dizia o que fazer e como fazer”.[2] Essa pessoa era um homem conhecido como Brendo dos Santos; quando ele foi morto em agosto de 2023, Os Crías começou a desmoronar.[3] Diante de um ultimato do Comando Vermelho, os membros de Os Crías foram forçados a ingressar às fileiras desse grupo ou correr o risco de serem eliminados.[4] Como resultado, o ecossistema criminoso local mudou drasticamente nos últimos dois anos. “Os Crías acabou”, afirmou um integrante do Comando Vermelho entrevistado no presídio de Tabatinga. “Ele não existe mais”.[5]

[1] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, autoridades policiais, Manaus, 2023; presidiários, Tabatinga, 16 de novembro de 2023.

[2] Entrevista telefônica conduzida pelo Crisis Group, autoridade policial brasileira, 12 de setembro de 2023.

[3] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, representante de ONG, Tabatinga, 15 de novembro de 2023.

[4] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, presidiários, Tabatinga, 16 de novembro de 2023; autoridades policiais, Letícia, 10 de outubro de 2023.

[5] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, presidiários, Tabatinga, 16 de novembro de 2023.

O objetivo atual do Comando Vermelho ... é afirmar a supremacia na região da tríplice fronteira, na esperança de se expandir para a Colômbia e o Peru.

O objetivo atual do Comando Vermelho, segundo um membro, é afirmar a supremacia na região da tríplice fronteira, na esperança de se expandir para a Colômbia e o Peru. O grupo quer controlar a cadeia de abastecimento de cocaína desde os campos de coca no Peru até as rotas de tráfico na Colômbia e nas regiões amazônicas do Brasil.[1] Para isso, oferecem incentivos aos moradores locais, explorando a ausência de oportunidades de trabalho legítimo. Os criminosos dão aos recrutas – geralmente homens e meninos de apenas quinze anos – pagamentos que incluem quantias de US$ 2.000 a US$ 2.400 para tarefas como o transporte de cocaína para Manaus, atraindo-os para vidas de crime e muitas vezes encorajando-os a recrutar outros.[2] O Comando Vermelho também afirma fornecer ajuda financeira, medicamentos e alimentos para famílias carentes nas áreas que controla. O seu objetivo principal, conforme descrito por um membro, é “conquistar tudo” – alcançar o domínio sobre os mercados e populações locais.[3]

Na Colômbia, o Comando Vermelho encontrou parceiros interessados na sua busca por expansão. Embora o conflito interno de 60 anos na Colômbia não tenha afetado o departamento do Amazonas em termos gerais, a frente Carolina Ramírez – uma facção dissidente das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) – está fazendo incursões na região.[4] Operando principalmente ao longo do rio Caquetá, que atravessa o departamento do Amazonas em direção ao Brasil, a frente Carolina Ramírez parece determinada a conquistar mais território na área da tríplice fronteira. No início, ela extorquia equipamentos e combustível dos guardas-florestais. “Como se estivessem [pegando] mantimentos”, lamentou um funcionário público, lembrando-se de como os guerrilheiros levaram o motor de popa do seu barco, combustível e a sua unidade GPS.[5] Em 2020, as tensões aumentaram quando os guerrilheiros convocaram funcionários do Instituto de Parques Nacionais para uma reunião, na qual anunciaram que os funcionários públicos estariam proibidos de trabalhar em reservas naturais designadas, como os Parques Nacionais Rio Puré e Amacayacu.[6]

A relação entre a frente e o Comando Vermelho se fortaleceu notadamente ao longo do ano passado. Carolina Ramírez vendia cocaína e maconha produzidas na Colômbia para o grupo criminoso brasileiro, mas um representante sênior de Carolina Ramírez – que atende pelo pseudônimo “El Tigre” – criou uma nova subunidade chamada Frente Amazonas em setembro de 2023, a qual se dedica ao tráfico de drogas e à extorsão de garimpeiros ilegais.[7] De acordo com investigadores policiais, muitos de seus membros são cidadãos brasileiros e estão presentes no município de Japurá, no Brasil. Autoridades de inteligência alertam que as relações entre os grupos de guerrilha colombianos e o Comando Vermelho podem se aprofundar, potencialmente convertendo suas forças combinadas no primeiro grande empreendimento criminoso binacional na Amazônia.[8]

Esse não seria o único revés para as autoridades estatais. Até agora, Carolina Ramírez tem participado de rodadas de diálogo com o governo colombiano no âmbito da estratégia de “paz total” do presidente Gustavo Petro.[9] Uma aliança formal com a facção criminosa brasileira poderia desferir um duro golpe nas ambições de paz de Petro e apresentar sérios dilemas de segurança regional.[10]


[1] Ibid.

[2] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, líder religioso, Benjamin Constant, 20 de janeiro de 2024.

[3] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, presidiários, Tabatinga, 16 de novembro de 2023.

[4] Carolina Ramírez fazia parte do Estado Mayor Central (EMC), uma facção dissidente das FARC liderada pelo codinome Iván Mordisco que não assinou o acordo de paz de 2016 entre o governo colombiano e a guerrilha, mas que iniciou diálogos com Bogotá. Em abril, divisões dentro do EMC pareciam indicar que a frente Carolina Ramírez se separou de Mordisco e está atuando como uma força independente. Após a conclusão do trabalho de campo para este briefing, Carolina Ramírez mudou de nome para Rául Reyes, mas este briefing irá referir-se a ela pelo seu nome original. Para mais informações, ver José David Rodríguez, “Disidencias instrumentalizan menores de edad y los entrenan para fabricar explosivos”, W Radio, 27 de maio de 2024.

[5] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, funcionário público, Colômbia, 2023.

[6] Ibid.

[7] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, autoridades policiais, Letícia, 10 de outubro de 2023.

[8] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, autoridades policiais, Amazonas (Brasil), 2023.

[9] Para mais informações, ver Elizabeth Dickinson, “Colombia’s Last Guerrillas Make First Step toward ‘Total Peace’”, Crisis Group Commentary, 23 de novembro de 2022; e Relatório N°98 do Crisis Group Latin America, Protecting Colombia’s Most Vulnerable on the Road to “Total Peace”, 24 de fevereiro de 2023.

[10] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, funcionários públicos, abril e maio de 2024. Os grupos do crime organizado peruano permaneceram majoritariamente locais. Proprietários de plantações de Lima, do interior do Peru e da Colômbia, conhecidos como patrones, supervisionam as plantações de coca na província de Mariscal Ramón Castilla com segurança privada. Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes comunitários indígenas, Mariscal Ramón Castilla, 13 de novembro de 2023.

As plantações de coca estão se expandindo no Peru, com grupos do crime organizado vindo do Brasil e guerrilheiros invadindo o território da Colômbia. Fonte: RAISG, OSM / CRISIS GROUP

III. Negócios Ilícitos

Os grupos criminosos são atraídos para a região da tríplice fronteira em grande parte devido às oportunidades que ela proporciona para controlar o fluxo de drogas ilícitas. A presença irregular do Estado nas áreas de fronteira e na maior parte da Amazônia permite que esses grupos tenham acesso praticamente irrestrito aos rios que correm, sem vigilância, para as principais cidades portuárias brasileiras ou, em menor extensão, para o Equador. A partir desses portos, grupos criminosos distribuem cocaína para consumo no Brasil ou a transportam para todo o mundo. Grande parte da luta entre os grupos criminosos – e o perigo concomitante que isso traz para a população civil – pode ser atribuída aos esforços para dominar essas rotas de tráfico. Ao mesmo tempo, essas organizações estão explorando recursos naturais na floresta amazônica para diversificar as suas fontes de renda e “lavar” seus lucros ilícitos. Até o momento, forças policiais nos três países têm sido incapazes de controlar esse influxo de organizações ilegais.

A. Produção de coca e cocaína

A cocaína é a principal causa do desmatamento na região da tríplice fronteira, em grande parte porque os grupos de tráfico de droga estão cada vez mais cultivando e processando a coca dentro da própria floresta. O núcleo da produção de coca na Amazônia está nos departamentos peruanos de Uyacali e Loreto. Fazendo fronteira com o Brasil, a Colômbia e o Equador, Loreto viu os seus hectares de plantações de coca quase triplicarem entre 2018 e 2022.[1] De acordo com uma autoridade peruana, o Comando Vermelho paga proprietários de plantações e laboratórios para manterem as suas operações em funcionamento, tal como fazem os investidores colombianos; até o momento, surgiram cerca de 200 laboratórios de processamento.[2] Estima-se que 70% da cocaína e da pasta base de cocaína produzidas no Peru sejam traficadas para o Brasil, enquanto cerca de 30% são levadas para o Equador, principalmente pelo rio Napo. Agentes de segurança admitem que a agência antinarcóticos do Peru, DIRANDRO – Dirección Antidrogas de la Policía Nacional del Perú, não tem presença ativa ao longo de algumas das principais rotas de tráfico.[3]


[1] Loreto passou de 5.072 hectares de cultivo de coca em 2018 para 13.844 em 2022. A província de Mariscal Ramón Castilla em Loreto é o centro da produção de cocaína: o cultivo de coca na província passou de 2.939 hectares em 2018 para 8.613 em 2022. Além disso, a maioria dos laboratórios de drogas está situada lá. DEVIDA, “Monitoreo de Cultivos de Coca 2022”, 2023. Quando o Crisis Group conversou com as autoridades antinarcóticos em novembro de 2023, elas disseram que haviam conseguido destruir apenas cinco laboratórios em 2022, acrescentando que esperavam derrubar muitos mais no futuro. Embora as autoridades policiais tenham denunciado o que descrevem como falta de recursos para cobrir as vastas distâncias na região, durante uma visita de campo, o Crisis Group visitou plantações de coca a poucos quilômetros de uma base militar. Portanto, pode não ser apenas a falta de recursos que inibe uma resposta enérgica do Estado aos grupos criminosos. Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, funcionários públicos, Mariscal Ramón Castilla, novembro de 2023 e janeiro de 2024.

[2] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, autoridade policial, Cuchillacocha, 14 de novembro de 2023. Ao contrário de outros territórios étnicos amazônicos, em Mariscal Ramón Castilla, populações indígenas como os Ticuna não fazem uso ancestral da folha de coca, portanto todas as plantações são para a produção de cocaína.

[3] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, autoridade policial, Cuchillacocha, 14 de novembro de 2023.

Os campos de coca estão se expandindo em tamanho e número na Amazônia peruana, impulsionados pelo aumento do investimento de organizações criminosas brasileiras e colombianas. Loreto, Peru. CRISIS GROUP / Bram Ebus

O Estado peruano tem sido incapaz de conter o crescimento do tráfico de drogas ou a violência que frequentemente o acompanha. O Peru tem ampla experiência em projetos de substituição de culturas, no âmbito dos quais o governo incentiva os produtores de coca a mudarem para culturas como o cacau. Mas os esforços de substituição de culturas em Loreto fracassaram, em grande parte porque os pequenos agricultores não têm financiamento, ferramentas técnicas e acesso aos mercados para fazer a mudança.[1] Para controlar a violência crescente, o governo peruano declarou estado de emergência na província de Mariscal Ramón Castilla em dezembro de 2023. Apesar dos poderes ampliados que essa designação deu aos agentes de segurança, eles dizem que estão em desvantagem em relação aos traficantes de droga.[2] Os grupos do crime organizado protegem seus laboratórios de coca mobilizando uma ou duas dúzias de homens carregando armas fabricadas nos EUA, incluindo M16s e lançadores de granadas que disparam munições de 40 mm.[3] “Estamos com um pouco de medo”, disse um funcionário público local. “Eles podem nos matar”.[4]

Pouco ou nenhum dos rendimentos do tráfico de cocaína chega às comunidades rurais e indígenas em Mariscal Ramón Castilla. A região está atolada na pobreza extrema, sem estradas transitáveis, eletricidade e água potável. Embora os narcotraficantes colombianos e brasileiros muitas vezes paguem aos líderes indígenas pelo acesso aos territórios das suas comunidades para cultivar coca, esses grupos criminosos frequentemente renegam os termos dos acordos e, basicamente, usurpam a terra.[5] Os líderes comunitários sentem-se impotentes para enfrentar os traficantes de drogas. Durante um grupo focal conduzido pelo Crisis Group no departamento do Amazonas, na Colômbia, um líder indígena descreveu essa dinâmica tensa: “Todo mundo tem armas; [os traficantes] já não prestam atenção [em nós] e ameaçam as autoridades”.[6]

Os grupos criminosos buscam mão de obra barata para as plantações nas comunidades locais, incluindo as do lado colombiano do rio. Aos povos indígenas – na sua maioria homens jovens – são oferecidos altos pagamentos para trabalharem nas plantações de coca, mas muitas vezes eles são pagos em pasta base de cocaína, uma substância seca que não foi purificada em cocaína e que pode ser fumada para se obter um efeito intenso. A pronta oferta dessa droga tem levado ao aumento do consumo, inclusive entre crianças.[7] Em alguns casos, quando os colhedores de folhas de coca exigiram pagamento em dinheiro aos proprietários das plantações, eles foram mortos. Na Colômbia, os traficantes de drogas ameaçaram membros da comunidade que desencorajam os seus filhos a trabalhar na produção de drogas no Peru.[8]


[1] O cacau, por exemplo, normalmente leva vários anos para se tornar produtivo, forçando alguns agricultores a voltar à coca para ganhar a vida. Entrevista conduzida pelo Crisis Group, líderes comunitários indígenas, Mariscal Ramón Castilla, 13 de novembro de 2023.

[2] Decreto Supremo que prorroga el Estado de Emergencia en las provincias de Putumayo y Mariscal Ramón Castilla del departamento de Loreto”, El Peruano, 12 de dezembro de 2023. Entrevista conduzida pelo Crisis Group, autoridade policial, Cuchillacocha, 14 de novembro de 2023.

[3] Embora sejam necessários cerca de vinte policiais armados para atacar um laboratório de drogas remoto, uma autoridade policial estimou que a invasão de Bellavista, em Mariscal Ramón Castilla, um vilarejo praticamente administrado por traficantes de drogas, exigiria uma força de pelo menos 200. Entrevista conduzida pelo Crisis Group, autoridade policial, Cuchillacocha, 14 de novembro de 2023.

[4] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, funcionários públicos, Mariscal Ramón Castilla, janeiro de 2024.

[5] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes comunitários indígenas, Mariscal Ramón Castilla, novembro de 2023.

[6] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes indígenas, Amazonas (Colômbia), outubro de 2023.

[7] Ibid. Entrevista telefônica conduzida pelo Crisis Group, funcionário humanitário, 7 de junho de 2024.

[8] Pamela Huerta, “The Poorest Narcos in the Drug-Trafficking Chain”, Amazon Underworld, 10 de agosto de 2023.

Membros da comunidade indígena local trabalham em plantações de coca administradas por estrangeiros. Poucos dos lucros do tráfico de drogas permanecem nas comunidades afetadas, as quais sofrem com crimes e danos ambientais. Loreto, Peru. Novembro de 2023. CRISIS GROUP / Bram Ebus

B. Tráfico de drogas

O tráfico de drogas tem sido uma importante fonte de rendas na região desde a década de 1980, quando Letícia se tornou um centro de transporte de substâncias ilícitas. O principal responsável foi Evaristo Porras, um traficante ligado ao chefão da cocaína Pablo Escobar, que estabeleceu o chamado Cartel del Amazonas, o qual – como o próprio nome sugere – se tornou o principal cartel de drogas da Amazônia.[1] Embora Porras tenha morrido em 2010, desde então a região se envolveu ainda mais profundamente no comércio internacional de drogas.[2] O aumento do cultivo de coca no Peru significa que há mais produto para levar ao mercado. Os sindicatos do crime estão disputando o controle das rotas de tráfico, especialmente aquelas que levam a Manaus, que fica à beira do Amazonas e ao longo do caminho que leva aos portos costeiros. Eles também pretendem dominar os mercados locais de drogas, estendendo a sua influência às cidades brasileiras próximas da área da tríplice fronteira, como Benjamin Constant e Atalaia do Norte, ambas situadas em afluentes que são corredores de tráfico cruciais.[3]

Os rios e afluentes da bacia amazônica que ligam a Colômbia e o Peru ao interior do Brasil e aos portos marítimos do Atlântico tornaram-se rodovias aquáticas para o tráfico de drogas. As equipes policiais enfrentam grandes desafios no controle dos rios rasos, em parte porque as suas embarcações de metal pesado são inadequadas para navegar nas hidrovias. Durante a estação chuvosa, os rios enchem até 15 metros, criando rotas de tráfico adicionais e oportunidades de ocultação.[4] A própria Amazônia tem visto um aumento enorme no trânsito de drogas desde 2016.[5] Simultaneamente, os casos de pirataria fluvial se multiplicaram. Também conhecidos como “ratos do rio”, os piratas roubam principalmente os moradores locais, mas às vezes atacam os traficantes com armas calibre .30 e .50.[6] Fontes locais alegam que policiais estão diretamente envolvidos na pirataria. “A polícia pega e vende”, disse uma liderança indígena que faz essa acusação.[7] As autoridades negam, alegando que criminosos usam uniformes com aparência oficial para confundir as pessoas.[8]


[1] Naquela época, as folhas de coca produzidas no Peru e na Bolívia eram processadas em laboratórios nos departamentos colombianos de Caquetá, Guaviare e Putumayo. Hernando Salazar, “Muere arruinado famoso capo colombiano”, BBC Mundo, 9 de março de 2010. Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes de comunidades indígenas e autoridades policiais, Brasil, Colômbia e Peru, 2023 e 2024.

[2] Porras morreu de insuficiência cardíaca, quatro anos depois de cumprir pena de prisão por enriquecimento ilegal e tráfico de drogas. En la quiebra murió el ex-narco Evaristo Porras”, El Tiempo, 9 de março de 2010.

[3] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, presidiários, Tabatinga, 16 de novembro de 2023.

[4] Entrevista telefônica conduzida pelo Crisis Group, acadêmico, 14 de abril de 2024.

[5] O tráfico de drogas aumentou tanto na Amazônia que, em 2019, um submarino improvisado carregando três toneladas de cocaína saiu de Letícia; quase um mês depois, as autoridades espanholas interceptaram-no na costa da Galiza. Sam Jones, “Cocaine seized from ‘narco-submarine’ in Spain was likely headed for UK”, The Guardian, 27 de novembro de 2019. Para mais informações, ver também “Tussle for the Amazon: New Frontiers in Brazil’s Organized Crime Landscape”, Diálogo Américas, 16 de novembro de 2022.

[6] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, autoridade policial, Tabatinga, 10 de outubro de 2023; lideranças comunitárias, Amazonas (Brasil), 2023 e 2024.

[7] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, liderança indígena, Amazonas (Brasil), setembro de 2023. Em fevereiro, nove policiais militares foram presos sob suspeita de desviar meia tonelada de drogas apreendida de criminosos. Para mais informações, ver “Operação prende nove PMs suspeitos de desviar meia tonelada de drogas no AM”, G1 Globo, 15 de fevereiro de 2024.

[8] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, autoridade policial, Tabatinga, 10 de outubro de 2023.

O Amazonas e seus afluentes oferecem aos narcotraficantes amplas oportunidades para transportar discretamente os narcóticos em direção aos centros de distribuição. Javari, Brasil. Janeiro de 2024. CRISIS GROUP / Bram Ebus

Os cartéis da droga não dependem apenas dos rios para que seus produtos cheguem ao mercado. Eles recrutam homens locais para atuarem como “mulas” e transportarem drogas por via terrestre através das fronteiras internacionais.[1] Homens indígenas carregam cargas que podem pesar até 50kg pela selva até pontos de entrega no Brasil. Eles caminham por semanas entre áreas de produção no Peru, passando pelo Parque Nacional Amacayacu na Colômbia e ao longo do rio Putumayo.[2] Eles transportam cocaína, bem como uma potente variedade de maconha conhecida como “creepy”, cultivada na região andina da Colômbia.[3] Antes de embarcar em sua jornada, esses homens indígenas costumam consultar xamãs para obter proteção espiritual.[4]

Desde 2015, o Brasil emergiu como um dos principais fornecedores de cocaína para os mercados europeus, mas a demanda doméstica também está crescendo.[5] Um membro do Comando Vermelho afirma que 95% dos pontos de venda de drogas em Tabatinga, conhecidos como bocas de fumo, pertencem à sua organização.[6] Nas comunidades indígenas do outro lado da fronteira com a Colômbia, os líderes locais também relatam uma tendência crescente de abuso de substâncias entre os jovens. O mesmo ocorre em cidades como Letícia e outros vilarejos ao longo dos corredores do tráfico de drogas.[7]


[1] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes indígenas e representantes da igreja, Atalaia do Norte, 18 de janeiro de 2024.

[2] Entrevista telefônica conduzida pelo Crisis Group, funcionário público, 1º de maio de 2024. Para mais informações, ver também Bram Ebus, “Colombian drug runners turn to shamans for protection”, Amazon Underworld, 15 de agosto de 2023.

[3] Os grupos criminosos estão ansiosos por controlar o transporte de drogas, além da produção, porque o preço da cocaína e da pasta base aumenta acentuadamente no caminho: 1kg de pasta base de cocaína custa entre 500 e 900 dólares na região da tríplice fronteira, mas pode custar até 4.000 dólares em Manaus. Nas ruas de São Paulo, 1kg de cocaína pode ser vendido por até US$ 4.400. A relação custo/benefício com a maconha é ainda maior, em parte devido aos menores custos de produção. Por exemplo, 1kg de “creepy” no município de Japurá pode ser vendido por US$ 100, enquanto pode custar entre US$ 800 e US$ 1.000 em Manaus. “Dinâmicas do mercado de drogas ilícitas no Brasil”, Centro de Excelência Para a Redução da Oferta de Drogas Ilícitas, 2022. Entrevista conduzida pelo Crisis Group, autoridade policial, Manaus, 22 de setembro de 2023.

[5] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líder indígena, Amazonas (Brasil), setembro de 2023; autoridade policial, Manaus, 22 de setembro de 2023. Para mais informações, ver também “Justiça manda prender seis PM’s suspeitos de chefiarem esquema de tráfico de drogas, no AM”, G1 Globo, 2 de dezembro de 2022; e Gabriel Stargardter, “Brazil’s gangs emerge as major cocaine exporters, flooding Europe with white powder”, Reuters, 12 de março de 2020.

[6] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, presidiários, Tabatinga, 16 de novembro de 2023.

[7] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes indígenas, Amazonas (Colômbia), outubro de 2023.

C. Extração ilegal de madeira, dragagem de ouro e pesca

Grupos criminosos estão se diversificando cada vez para a extração ilegal de madeira, a dragagem de ouro e a pesca. Estas atividades permitem que eles “lavem” o dinheiro obtido com o tráfico de drogas: as autoridades governamentais no Brasil referem-se à “narco-mineração” e aos “narcomadeireiros” para descrever como os lucros das drogas são reinvestidos nas indústrias da madeira e do ouro.[1] Mas os grupos criminosos não se envolvem apenas nestas atividades para lavagem de dinheiro; eles também procuram outra fonte de renda mais segura. Como o policiamento se concentra em restringir a produção e o transporte de cocaína, outras iniciativas ilegais tendem a ser policiadas de forma mais branda.[2] De fato, em alguns casos, funcionários públicos corruptos facilitam a entrada no mercado de produtos obtidos ilegalmente ao fornecer documentação falsa, o que dá a esses grupos acesso à cadeia de abastecimento legal.

Os grupos criminosos tornaram-se particularmente ativos na pesca ilegal. (A atividade é ilegal se for realizada em violação às regulamentações governamentais, durante determinados meses ou em áreas protegidas.) Certas espécies de peixes amazônicos atingem preços elevados, em particular o arapaima gigas – conhecido como pirarucu no Brasil e paiche no Peru. Anos de pesca excessiva não regulamentada esgotaram os estoques de pirarucu, levando os governos do Peru, Colômbia e Brasil a classificá-lo como uma espécie protegida. No entanto, isso pouco fez para prejudicar o mercado, e as empresas que conseguem transportar o peixe para fora da Amazônia obtêm lucros impressionantes. Embora os mercados locais normalmente ofereçam pirarucu a preços que variam de US$ 1,50 a US$ 2,50 por quilo, em Letícia os preços sobem para cerca de US$ 6 antes de o peixe ser transportado para fora da região.[3] Essas margens de lucro induziram os traficantes de droga a investir em grandes operações de pesca, desafiando as regulamentações estatais para evitar a sobrepesca. Além disso, há relatos de que carregamentos de peixe estão sendo usados para esconder narcóticos.[4]


[1] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, funcionários públicos que trabalham com povos indígenas, Manaus, 18 de setembro de 2023.

[2] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, polícia ambiental, Manaus, 21 de setembro de 2023.

[3] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, polícia ambiental, Manaus, 21 de setembro de 2023; Atalaia do Norte, 18 de janeiro de 2024. Para mais informações, ver também Rodrigo Pedroso, Nelly Luna Amancio e Jonathan Hurtado, “La triple frontera de la pesca ilegal: mafias e impunidad detrás del tráfico en la Amazonía”, Ojo Público, junho de 2023.

[4] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes indígenas, Atalaia do Norte, 18 de janeiro de 2024. Os pequenos pescadores exigem que não sejam comparados a grupos maiores, que muitas vezes são financiados por grupos criminosos, observando que eles não possuem os recursos financeiros necessários para as operações maiores. Cícero Pedrosa Neto, “The final minutes of Bruno and Dom in São Rafael”, Amazônia Real, 20 de junho de 2022. Entrevista conduzida pelo Crisis Group, pescador, região do Vale do Javari, 19 de janeiro de 2024.

O mercado de Letícia. Os lucros do tráfico de drogas são reinvestidos na pesca ilegal para lavar dinheiro e aumentar receitas. Letícia, Colômbia. Janeiro de 2024. CRISIS GROUP / Bram Ebus

A extração e o processamento ilegal de madeira também são desenfreados na Amazônia. Para legitimar a madeira brasileira cortada ilegalmente, criminosos usam documentos peruanos falsificados. Madeira derrubada ilegalmente no Peru também é importada para a Colômbia com documentação falsa.[1] As autoridades locais corruptas facilitam essas atividades, com os funcionários recebendo em troca propinas dos traficantes de madeira.[2] Os traficantes de drogas também usam madeira para esconder cocaína.[3]

A dragagem de ouro, especialmente ao longo do rio Purué (o qual é conhecido como Puré quando atravessa a Colômbia, antes de chegar ao Brasil), também tem aumentado. O Comando Vermelho supostamente financia operações extrativistas ilegais em certas ocasiões e, em alguns casos, compra ouro diretamente dos garimpeiros.[4] Os garimpeiros locais também reclamam que os guerrilheiros colombianos e os oficiais corruptos da Polícia Militar brasileira frequentemente extorquem pagamentos daqueles que trabalham no rio, exigindo uma certa quantidade de ouro por draga de mineração.[5]

As autoridades brasileiras e colombianas tentaram reprimir a dragagem ilegal, mas as suas medidas foram ineficazes: depois que agentes policiais encerram as operações ilícitas, as dragas ressurgem. Fontes dizem que funcionários públicos corruptos vazam informações sobre operações futuras, permitindo que criminosos afundem as dragas intencionalmente; após a saída das forças de segurança, eles recuperam as dragas ou as escondem em rios afluentes.[6] Em abril, novas dragas foram detectadas no Parque Nacional Rio Puré, inclusive em uma área de acesso proibido preservada para proteger uma tribo indígena em isolamento voluntário, os Yurí-Passé (consulte a Seção V.A). Durante sobrevoos, autoridades governamentais encontraram dragas adicionais nos rios Purité e Cotuhé, no Parque Nacional Amacayacu, na Colômbia, e na fronteira com o Peru.[7]


[1] Uma consequência não intencional de uma regulamentação mais rigorosa é que as comunidades que historicamente dependiam da madeira para a sua subsistência estão em dificuldades. Em Islandia, um vilarejo peruano que antes dependia da madeira, o colapso das fábricas locais após as restrições às concessões florestais para o corte de árvores levou os moradores a atividades ilícitas, como a colheita de folhas de coca. Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, lideranças indígenas, Atalaia do Norte, 18 de janeiro de 2023; residentes e empresários, Islandia, janeiro de 2024.

[2] Condenando el Bosque”, Environmental Investigation Agency, junho de 2019.

[3] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, lideranças indígenas, Atalaia do Norte, 18 de janeiro de 2023.

[4] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, autoridade policial, Manaus, 22 de setembro de 2023.

[5] Bram Ebus e Rodrigo Pedroso, “Gold Spurs Crime and Corruption on Brazil-Colombia Border”, Amazon Underworld, 3 de agosto de 2023.

[6] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, líder indígena, Amazonas (Brasil), setembro de 2023; Autoridades policiais colombianas, Letícia, 10 de outubro de 2023.

[7] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, representantes de ONGs, abril de 2024. Para mais informações, ver também Pilar Puentes, “Parque Nacional Amacayacu: rodeado por la minería ilegal y controlado por grupos armados que restringen el ingreso de guardaparques”, Mongabay, 17 de outubro de 2023.

O comércio ilegal de madeira ocorre nos três países, à medida que toras entram nas cadeias de suprimentos legais com documentos falsos. Javari, Brasil/Peru. Janeiro de 2024. CRISIS GROUP / Bram Ebus

D. Falhas no policiamento

As forças policiais na área estão mal equipadas, com falta de pessoal e mal preparadas para responder à violência e à degradação ambiental provocadas pela expansão do crime organizado. A polícia e outras forças de segurança em toda a região da tríplice fronteira reconhecem a necessidade de coordenar melhor a sua abordagem ao crime. “O que acontece lá nos afeta aqui”, disse uma autoridade policial colombiana, referindo-se ao crime do outro lado das fronteiras peruana e brasileira.[1] O fato de que as forças de nenhum país podem perseguir ou prender criminosos fora da sua própria jurisdição é uma das razões pelas quais os grupos ilegais conseguem operar impunemente na região.

Os criminosos sabem que podem tirar vantagem das fronteiras porosas. Um detento no presídio de Tabatinga explicou que as transações ilícitas, como a entrega de dinheiro, são realizadas a poucos metros da fronteira, permitindo uma fuga rápida caso a polícia apareça.[2] A polícia de Letícia e Tabatinga se comunica via WhatsApp, mas devido à falta de confiabilidade das conexões de internet na área, as mensagens às vezes chegam tarde demais.[3] Há rumores de que membros sênior de gangues em Tabatinga mantêm um perfil discreto durante os períodos de maior vigilância nos arredores de Letícia, evitando encontros com forças policiais brasileiras em seu lado da fronteira.[4]

A falta de recursos também prejudica a capacidade das forças de segurança de lidar com o crime. A situação difícil da força policial na cidade peruana de Islandia, que na verdade é uma ilha, é reveladora. Seus dois barcos estão quebrados; como resultado, não podem perseguir traficantes de droga e de madeira que circulam livremente por seus postos. Os agentes juntaram seu próprio dinheiro para comprar um roteador Wi-Fi, mas não conseguiram pagar pelo serviço de Internet e ainda não têm uma impressora que funcione para documentos oficiais.[5] Autoridades governamentais colombianas disseram ao Crisis Group que, antes de a frente Carolina Ramírez proibir os funcionários do Instituto de Parques Nacionais de atuar na área, os guardas-florestais podiam monitorar a atividade criminosa de um posto de controle próximo à fronteira, onde o Rio Puré cruza para o Brasil. “Durante seis anos conseguimos evitar [barcaças de mineração], então isso pode ser feito”, disse um funcionário público.[6] Mas durante a pandemia da COVID-19, o posto foi incendiado e barcaças de mineração começaram a cruzar a fronteira vindo do Brasil.[7] O posto ainda não foi reconstruído.


[1] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, autoridade policial, Letícia, outubro de 2023.

[2] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, presidiários, Tabatinga, 16 de novembro de 2023.

[3] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, policiais, Tabatinga, outubro de 2024.

[4] Ibid.

[5] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, autoridades policiais, Mariscal Ramón Castilla, janeiro de 2024.

[6] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, funcionário público, Letícia, outubro de 2023

Com verbas limitadas, as instituições estatais ... têm dificuldade em proteger as comunidades vulneráveis e o meio ambiente

Com verbas limitadas, as instituições estatais também têm dificuldade em proteger as comunidades vulneráveis e o meio ambiente. A agência estatal para assuntos indígenas no Brasil, a FUNAI, só pode operar em campo com o acompanhamento de forças de segurança devido às constantes ameaças à sua equipe, o que dificulta a resposta a atividades criminosas em tempo hábil.[1] Funcionários da FUNAI expressam preocupação com a facilidade para cometer crimes impunemente nas terras indígenas da Amazônia.[2] Da mesma forma, nos últimos meses, a polícia ambiental do Brasil, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade reduziram as inspeções de campo destinadas a combater o desmatamento ilegal e a extração de ouro em terras indígenas.[3] Depois que o governo do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva ter conseguido uma redução de 50% no desmatamento no seu primeiro ano de mandato em 2023, a queda no número de inspeções despertou a preocupação de que as práticas destrutivas ao meio ambiente possam voltar a crescer.[4]

Os baixos salários dos funcionários públicos, por sua vez, geraram uma corrupção desenfreada nos três países fronteiriços. Os agentes policiais da província peruana de Mariscal Ramón Castilla foram implicados na facilitação do tráfico de drogas e até mesmo na participação direta em atividades ilícitas.[5] Da mesma forma, na Colômbia, oficiais do exército lamentam que os criminosos sejam capazes de “comprar” – leia-se, subornar as autoridades para fornecerem – informações, comprometendo os esforços de policiamento.[6] Fontes também disseram ao Crisis Group que as forças de segurança brasileiras compartilham informações com redes criminosas. Um tenente-coronel do exército brasileiro, por exemplo, foi acusado de receber cerca de US$ 200.000 em propinas para alertar os mineiros sobre repressões iminentes entre 2020 e 2022.[7] Em 2023, o secretário de segurança do estado brasileiro do Amazonas foi preso sob suspeita de colaboração com uma organização criminosa.[8]


[1] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, funcionários públicos que trabalham com povos indígenas, Manaus, 18 de setembro de 2023.

[2] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, funcionários públicos, Amazonas (Brasil), 2023.

[3] Mariana Durão e Leonardo Lara, “Brazil labor spat thwarts Lula’s bid to boost growth and save the Amazon”, Bloomberg, 6 de abril de 2024.

[4] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, autoridade policial, Amazonas (Brasil), 2023.

[5] Três policiais foram condenados a dezoito meses de prisão preventiva em junho de 2023. Doris Aguirre, “Loreto: agentes PNP eran ‘topos’ de narco en el trapecio amazónico”, La República, 22 de junho de 2023.

[6] Por exemplo, os garimpeiros ilegais de ouro geralmente recebem dicas sobre fiscalizações iminentes. Quando isso acontece, eles simplesmente transportam as suas barcaças de mineração da Colômbia para o Brasil, ou vice-versa, uma vez que a polícia dos dois países raramente coordena as suas operações. Entrevista conduzida pelo Crisis Group, autoridades policiais, Letícia, 10 de outubro de 2023.

[7] O oficial alegou que é inocente e o seu advogado afirmou que o seu cliente foi acusado em retaliação pelo trabalho que tem realizado na região no combate à mineração ilegal. Eduardo Gonçalves, “PF aponta que militar recebeu R$ 930 mil para vazar dados de operações a garimpeiros da Amazônia”, O Globo, 29 de junho de 2023.

[8] Vinicius Sassine, “Secretário de Segurança do AM é preso em operação sobre extorsão a criminosos”, Folha de S. Paulo, 29 de agosto de 2023.

IV. Violência na Amazonia

Mesmo para os padrões da América Latina e do Caribe, a Amazônia agora se destaca pelos seus altos índices de violência.[1] Em 2022, Letícia emergiu como a segunda cidade mais violenta da Colômbia, enquanto Tabatinga relatou uma taxa de homicídios de 80 pessoas por 100.000 habitantes em 2023, classificando-se entre as mais altas da Amazônia.[2] Grande parte dessa violência decorre da competição entre grupos criminosos rivais por esquemas ilegais e território.


[1] Com apenas 8% da população mundial, a América Latina e o Caribe são responsáveis por 29% dos homicídios em todo o mundo. Para mais informações, ver Ebus e Eberle, “Crimes against the Climate: Violence and Deforestation in the Amazon”, op. cit.; “Environmental and Climate Justice, and the Dynamics of Violence in Latin America”, op. cit.; “Justiça Ambiental e Climática e a Dinâmica da Violência na América Latina”, SIPRI, fevereiro de 2024; e “Justicia ambiental y climática, y las dinámicas de violencia en América Latina”, Friedrich-Ebert-Stiftung Colombia, fevereiro de 2024.

[2] Dados fornecidos pela polícia nacional colombiana.

O assassinato de Dom Phillips, um correspondente do jornal britânico The Guardian, e do seu guia local, o defensor dos direitos indígenas Bruno Pereira, chamou a atenção internacional para o alto nível de violência na região.[1] Muito antes destas mortes, a criminalidade já estava em ascensão em toda a região. As comunidades da área testemunharam assassinatos e alguns dos seus líderes foram deslocados à força, enquanto grupos criminosos intensificaram o recrutamento de menores.[2]

A violência intensificou-se nas áreas urbanas da região da tríplice fronteira à medida que facções criminosas disputam o controle dos mercados ilícitos, enquanto grupos armados na floresta tropical ameaçam os suspeitos de informar as autoridades estatais ou de se oporem às suas operações. Uma rede de sicários (assassinos pagos) que fogem da captura tornou-se notória na região. Eles evitam responder pelos seus crimes não só porque as instituições do Estado e de segurança são negligentes, mas também porque podem facilmente atravessar fronteiras. Eles podem cometer um assassinato em Tabatinga, no Brasil, mas depois passar por uma travessia não supervisionada para Letícia, na Colômbia, ou pegar um barco por algumas centenas de metros até o Peru.

Um homem indígena que trabalhou para um grupo criminoso que opera no Brasil, na Colômbia e no Peru contou a sua própria história como exemplo de como essas organizações atraem adolescentes locais para cometer atos de violência. Aos treze anos, ele começou a trabalhar para um traficante de drogas, sendo sua principal função conectar jovens meninas indígenas a redes de exploração sexual.[3] Aos dezessete anos, ele já era um assassino profissional e acabou se tornando coordenador de um grupo composto por mais de três dúzias de assassinos contratados.[4] Essa carreira criminosa, diz ele, deixou cicatrizes físicas e mentais. “Todas as noites, quando fecho os olhos, vejo os rostos daqueles que assassinei, os corpos que desmembrei”, confessou o sicário.[5]


[1] Segundo as autoridades locais, Pereira era o principal alvo do ataque e Phillips pode ter sido um dano colateral. Embora o então presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, tenha afirmado que Phillips não era querido na região, chamando sua empreitada de imprudente, os oficiais de inteligência acreditam que os homens foram atacados devido a uma disputa crescente entre Pereira e os pescadores locais. A lenta resposta do Estado ao crime levou grupos indígenas locais a organizar comitês de busca, que revelaram interesses criminosos concorrentes na região da tríplice fronteira. Ruben Dario da Silva Villar, conhecido como “Colômbia”, um traficante de drogas peruano com vínculos com os setores de cocaína e pesca, é acusado de ser o mentor dos assassinatos; três homens que foram presos aguardam julgamento. “Dom Philips estava no lugar errado, no dia errado”, disse uma autoridade policial local. Vários homens foram presos pelos assassinatos. Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, funcionários públicos, Amazonas (Brasil), outubro de 2023. Tom Phillips, “Indigenous groups scour forests and rivers for Dom Phillips and Bruno Pereira”, The Guardian, 10 de junho de 2022. Constance Malleret, “Brazil police make new arrest in Dom Phillips and Bruno Pereira murder investigation”, The Guardian, 19 de janeiro de 2024.

[2] Um jovem entrevistado numa prisão local disse ao Crisis Group que não teve outra escolha senão se juntar a uma gangue para manter a sua família segura; a única decisão que tinha em mãos era de qual dos grupos que atuavam na área ele preferiria fazer parte. Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, presidiários, Tabatinga, 16 de novembro de 2023. Para mais informações, ver também “Dos masacres en Amazonas: nuevo escenario en la disputa de las disidencias de Farc”, El Espectador, 13 de abril de 2022.

[3] Grupos criminosos locais frequentemente recrutam homens e mulheres jovens que vivem nas proximidades. A maioria das vítimas desses grupos também vem desse mesmo segmento da população. Entrevista conduzida pelo Crisis Group, funcionário público, Islandia, 20 de janeiro de 2024.

[4] A maioria dos recrutas tem entre 18 e 22 anos, embora as gangues ocasionalmente recrutem menores de oito anos como vigias ou os envolvam na venda de drogas nas escolas. Entrevista conduzida pelo Crisis Group, representante de ONG, Tabatinga, outubro de 2023.

[5] Entrevista Crisis Group, membro de organização criminosa, Amazonas (Colômbia), novembro de 2023.

Depois que uma pessoa se junta a um grupo criminoso, sair é muito difícil.

Depois que uma pessoa se junta a um grupo criminoso, sair é muito difícil. Para aqueles que estão determinados a abandonar uma organização, tornar-se membro de uma igreja evangélica é a saída mais confiável. Essas igrejas chegaram a um acordo com os líderes de gangues segundo o qual a saída de um membro será aceita desde que ele ou ela demonstre verdadeira devoção e fé.[1] “O governo não pode fazer isso e não custa dinheiro ao Estado”, declarou um líder de uma igreja evangélica em Benjamin Constant, uma pequena cidade brasileira.[2] Mas nem todos têm essa escolha. O ex-chefe do sicário indígena, um proeminente traficante de drogas local, era dono de plantações no Peru onde, segundo ele, os corpos dos inimigos eram dados como alimento aos jacarés.[3]

Grupos de crime organizado estabeleceram-se nos principais centros urbanos nesta parte da Amazônia, trazendo consigo picos de violência resultando em mortes. Os alvos de assassinatos planejados em Tabatinga recebem alertas por meio de listas de óbitos, divulgadas nas redes sociais e em grupos de mensagens de texto. Nas listas mostradas ao Crisis Group, os indivíduos tinham a palavra “decretado” rabiscada em fotos de seus rostos.[4] As listas incluíam membros de grupos rivais, mulheres envolvidas na venda de drogas para facções concorrentes e homens que supostamente disputavam o afeto da namorada de um membro de gangue.[5]

A violência de gênero tornou-se assustadoramente comum em Tabatinga, mas há poucos serviços de apoio ou casas de abrigo na cidade. Outras partes do Brasil, especialmente cidades grandes como o Rio de Janeiro, oferecem uma maior rede de segurança, muitas vezes com o apoio de órgãos governamentais como o Ministério da Mulher no Brasil. Membros de gangues supostamente perpetraram estupros coletivos em Tabatinga, onde as vítimas incluem menores de idade.[6] No início de 2024, membros do Comando Vermelho picharam ameaças nas paredes do único abrigo para vítimas de violência de gênero em Tabatinga.[7] No lado colombiano da fronteira, o departamento do Amazonas tem o maior índice de violência de gênero em todo o país.[8] Mulheres jovens e meninas de comunidades ribeirinhas nas margens colombiana e peruana do rio Amazonas são frequentemente aliciadas, por vezes sob falsos pretextos, a trabalhar em zonas de cultivo de coca no Peru, onde são frequentemente submetidas à exploração sexual ou até mesmo à morte. A violência sexual é particularmente difundida nas comunidades indígenas e, muitas vezes, anda de mãos dadas com o consumo de álcool.[9]

As forças de segurança do Estado também cometem violência, disseram moradores locais ao Crisis Group. Em Tabatinga, agentes da Polícia Militar do Brasil supostamente torturaram e mataram sete homens em 2021; alguns dos corpos foram descartados depois no lixão local.[10] Autoridades públicas da região dizem estar cientes dessas alegações.[11] As consequências judiciais para esses atos, no entanto, permaneceram indefinidas. “Não creio que o sistema judicial esteja preparado para perseguir os agentes policiais”, disse uma fonte oficial.[12] Os familiares de uma vítima de homicídio receberam ameaças explícitas alertando-os para não chamarem a atenção para a falta de repercussões para os perpetradores da violência.[13] “Na nossa percepção, essas organizações [criminosas] estão muito bem organizadas também dentro das instituições, especialmente a polícia”, explicaram autoridades em Tabatinga.[14] Oficiais de alto escalão da Polícia Militar de Tabatinga entrevistados pelo Crisis Group rejeitaram as alegações de corrupção e irregularidades dentro de sua instituição.[15]


[1] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes religiosos e indígenas, Amazonas (Brasil), janeiro de 2024.

[2] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, líder religioso, Benjamin Constant, 20 de janeiro de 2024.

[3] Entrevista Crisis Group, membro de organização criminosa, Amazonas (Colômbia), novembro de 2023.

[4] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, funcionários públicos, Tabatinga, 10 de outubro de 2023; representante de ONG, Tabatinga, 15 de novembro de 2023; presidiários, Tabatinga, 16 de novembro de 2023.

[5] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, funcionários públicos, Tabatinga, 10 de outubro de 2023.

[6] Ibid. 

[7] Entrevista telefônica conduzida pelo Crisis Group, representante de ONG, 8 de maio de 2024.

[9] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes comunitários indígenas, Brasil, Colômbia e Peru, 2023 e 2024.

[10] Fabiano Maisonnave, “Após assassinato de sargento, PM promove destrói carnificina em Tabatinga (AM)”, Folha de São Paulo, 30 de junho de 2021. Fontes indicaram ao Crisis Group que um inquérito ainda está em andamento. Entrevistas telefônicas conduzidas pelo Crisis Group, abril e maio de 2024. A Polícia Militar do Brasil é uma força de segurança estatal encarregada de manter a ordem e a segurança públicas. Cada um dos 26 estados do Brasil e o Distrito Federal possuem sua própria Polícia Militar, operando sob a autoridade do governador do estado. Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, funcionários públicos, Amazonas (Brasil), 2023 e 2024.

[11] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, funcionários públicos, Amazonas, 2023.

[12] Ibid.

[13] Entrevista telefônica conduzida pelo Crisis Group, familiar da vítima de homicídio, maio de 2024.

[14] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, funcionário público brasileiro, Manaus, 18 de setembro de 2023.

[15] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, policiais militares, Tabatinga, outubro de 2024; funcionários públicos, Bogotá, 5 de junho de 2024.

V. Comunidades e meio ambiente

A invasão de atividades criminosas está ameaçando a segurança das comunidades que há muito tempo fazem da Amazônia seu lar, danificando os locais onde vivem e gerando violência. Grupos indígenas e ribeirinhos – não nativos da floresta tropical que vieram para a Amazônia durante a febre da borracha no final do século XIX e início do século XX – sentem-se ameaçados e desprotegidos pelo Estado. Devido ao seu papel fundamental como defensores do meio ambiente, os ataques contra essas comunidades indígenas podem abrir caminho para acelerar a destruição da floresta tropical.

Um parque de diversões em Atalaia do Norte, Brasil. Janeiro de 2024. CRISIS GROUP / Bram Ebus

A. Grupos indígenas sob ameaça

As incursões de grupos criminosos em terras indígenas colocam essas comunidades em perigo.[1] Uma área sob ameaça é o Vale do Javari, no Brasil, que abriga uma mistura de grupos voluntariamente isolados e outros em “contacto inicial” com o mundo ocidental. (Contato inicial refere-se ao período em que grupos externos estabelecem pela primeira vez uma comunicação regular e um relacionamento formal com o grupo anteriormente isolado.[2]) Os Yurí-Passé – um grupo seminômade composto por aproximadamente 400 membros que viveram em isolamento voluntário há pelo menos 500 anos no Parque Nacional Rio Puré, na Colômbia – também estão em risco.[3] Facções guerrilheiras e garimpeiros ilegais estão invadindo suas terras, o que poderá levar à sua extinção, em grande parte porque os recém-chegados podem expô-los a doenças às quais eles não têm imunidade. Segundo um especialista em assuntos indígenas, “esses contatos não regulamentados geralmente passam despercebidos ao radar institucional e geram consequências desastrosas”.[4] Quando esses grupos desaparecem, a floresta torna-se mais vulnerável à exploração, podendo causar efeitos em cascata que prejudicam todo o ecossistema.

A demarcação de territórios – essencialmente, o estabelecimento de limites legais em torno de terras consideradas pertencentes a comunidades específicas – é útil, mas insuficiente para proteger esses grupos. O Brasil, a Colômbia e o Peru não medem esforços para demarcar os territórios indígenas, mas, na ausência de serviços estatais e de segurança eficazes, os grupos criminosos continuam a invadir estas áreas. No Brasil, os líderes indígenas reclamam que o compartilhamento de informações detalhadas sobre as rotas do tráfico de drogas e o modus operandi dos grupos criminosos locais com as forças policiais não levou a uma resposta tangível.[5]

De fato, os membros desses grupos dizem que falar abertamente é perigoso. Um líder indígena disse ao Crisis Group que ameaças violentas de criminosos que buscam explorar os recursos naturais da região o forçaram a deixar o Vale do Javari. Nem mesmo a relocação o protegeu desse grupo criminoso: segundo ele, homens armados o perseguiram em seu esconderijo no interior do Brasil.[6] Na Colômbia, organizações guerrilheiras e grupos criminosos entraram em territórios indígenas para recrutar jovens, ameaçando líderes comunitários que protestam contra a sua presença. Enquanto isso, os líderes indígenas no Peru denunciaram funcionários públicos por venderem lotes de terra dentro de territórios indígenas legalmente demarcados a investidores privados.[7]

Dados os grandes riscos não apenas para aqueles vulneráveis ao recrutamento, mas também para a própria sobrevivência das comunidades indígenas, os membros desses grupos organizaram as suas próprias patrulhas, vigiando os rios e outros pontos de acesso às suas terras.[8] Embora essas iniciativas pudessem, em teoria, funcionar como um sistema de alerta precoce para funcionários do governo que buscam evitar incursões ilícitas de grupos criminosos, na prática isso não aconteceu. Os aldeões do lado colombiano do rio Amazonas, por exemplo, alertaram a polícia local de que pelacaras (palavra usada para designar intrusos armados) tinham entrado no seu território em várias ocasiões em 2023, mas as forças policiais não agiram ao receber a denúncia.[9] Da mesma forma, líderes indígenas no Peru relataram que membros de Os Crías e do Comando Vermelho estão presentes nas aldeias de Bellavista Callaru, Santa Rosa e Caballococha.[10]


[1] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, lideranças indígenas, Atalaia do Norte, 17 de janeiro de 2023.

[2] A FUNAI, órgão estatal brasileiro, é responsável pelo contato inicial com grupos indígenas isolados e pela mitigação dos riscos decorrentes da interação.

[3] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, funcionário público, Letícia, outubro de 2023.

[4] De acordo com o direito internacional, incluindo a Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas de 2007, os Estados têm a obrigação de proteger os grupos étnicos em isolamento voluntário. Entrevista telefônica conduzida pelo Crisis Group, especialista em povos indígenas, 13 de abril de 2024. Além das ameaças violentas, a rápida modernização e a introdução do serviço de Internet geram desafios para comunidades indígenas remotas. Jack Nicas, “The internet’s final frontier: Remote Amazon tribes”, The New York Times, 2 de junho de 2024.

[5] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, líder indígena, Amazonas (Brasil), setembro de 2023.

[6] Entrevista telefônica conduzida pelo Crisis Group, líder indígena, 5 de outubro de 2023.

[7] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes indígenas em Mariscal Ramón Castilla e Atalaia do Norte, novembro de 2023 e janeiro de 2024. Para mais informações, ver também Alerta Temprana Nº 007-24, Defensoría del Pueblo da Colômbia, 18 de março de 2024.

[8] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes indígenas, Amazonas (Colômbia), outubro de 2023.

[9] Ibid. As autoridades policiais alegaram que este caso era mais um boato do que uma ameaça séria. Entrevista conduzida pelo Crisis Group, autoridades policiais, Letícia, outubro de 2023.

[10] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes indígenas, Amazonas (Colômbia), outubro de 2023.

Um morador de rua dorme em frente a um muro pichado pelo Comando Vermelho; o muro também mostra um pôster defendendo os direitos indígenas. Manaus, Brasil. Setembro de 2023. CRISIS GROUP / Bram Ebus

B. Ribeirinhos do Brasil

Ribeirinhos, descendentes de trabalhadores recrutados para trabalhar na indústria da borracha da Amazônia no século XX, também lutam para sobreviver na região. Os ribeirinhos vivem há muito tempo na pobreza. Atraídos para a floresta para colher látex no final do século XIX e trabalhar nas plantações de seringueiras durante a Segunda Guerra Mundial, eles foram submetidos a condições de exploração, em alguns casos suportando servidão por dívida. Hoje, seus descendentes se sustentam com a pesca. Cada vez mais, no entanto, eles têm dificuldade em prosseguir com esse meio de subsistência.

Uma das causas de suas dificuldades é a decisão do governo brasileiro, na década de 1990, de demarcar terras indígenas no Vale do Javari para proteger grupos ancestrais ameaçados por madeireiros. Embora esta iniciativa tivesse em mente os interesses das comunidades e do meio ambiente, um dos seus efeitos colaterais foi limitar a capacidade dos ribeirinhos de pescar em terras indígenas. Membros de grupos indígenas agora patrulham as águas e enfrentam os pescadores, às vezes com espingardas. Eles não são os únicos a reprimir os ribeirinhos. “Eu nasci em território indígena”, disse um ribeirinho idoso, cujo pai se mudou para a região durante o boom da borracha na Segunda Guerra Mundial. Agora, queixa-se ele, as forças de segurança estaduais e federais aumentaram a fiscalização de infrações ambientais. Elas o punem mesmo quando ele está transportando peixes pescados em zonas permitidas.[1]

É certo que os ribeirinhos não são espectadores inocentes. Vários ribeirinhos foram presos em decorrência dos assassinatos de Bruno Pereira e Dom Phillips. Na sequência, forças policiais reprimiram a pesca de ribeirinhos em águas protegidas. No entanto, as restrições aos seus meios de subsistência tradicionais forçaram um maior número deles a procurar trabalho em mercados ilícitos. Os grupos de crime organizado têm frequentemente um maior sucesso ao atrair ribeirinhos mais jovens para as suas fileiras.[2]


[1] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, pescador, região do Vale do Javari, 19 de janeiro de 2024.

[2] Entrevista conduzida pelo Crisis Group, representante de ONG, Tabatinga, 15 de novembro de 2023.

C. Danos ambientais

O aumento da atividade criminosa na região da tríplice fronteira tem prejudicado o meio ambiente, embora não nos níveis observados em outras partes da Amazônia.[1] Em toda a bacia amazônica, a pecuária e a agricultura industrial são as principais forças que destroem a floresta tropical.[2] Esse não é o caso na região da tríplice fronteira, particularmente no Peru, onde as plantações de coca – que exigem o desmatamento de menos hectares de floresta do que outros negócios que destroem a selva – são o principal motor da degradação ambiental.[3] Ainda assim, a rápida expansão das economias criminosas provavelmente prefigura níveis piores de destruição ambiental e perda de controle estatal da floresta tropical no futuro. Já invadidas por garimpeiros ilegais e traficantes de droga, essas zonas fronteiriças podem se tornar uma das próximas áreas devastadas da Amazônia se não forem tomadas medidas urgentes. Fontes afirmam que vários líderes indígenas têm concedido permissão para plantações de coca em troca de dinheiro. “Eles decidiram de bom grado destruir a sua floresta”, disse um líder comunitário indígena ao Crisis Group.[4]

Não é apenas o cultivo da coca, mas também a produção de cocaína que está danificando a floresta. No processo de fabricação da pasta de coca, laboratórios operados por grupos criminosos despejam resíduos químicos – incluindo acetona, gasolina e ácido sulfúrico – nos rios e no solo da Amazônia.[5] Perto de Tipísca, na Colômbia, os moradores locais reclamam dos laboratórios de drogas nas comunidades peruanas próximas. “Isso nos afeta porque, quando chove, todos os produtos químicos são levados para o rio”, disse um líder indígena, que acrescentou que sua comunidade é obrigada a consumir águas contaminadas.[6]


[1] Para obter os dados mais atuais sobre o desmatamento na Amazônia, consulte as ferramentas de monitoramento fornecidas pela Global Forest Watch.

[2] Relatório N°91 do Crisis Group Latin America, A Broken Canopy: Preventing Deforestation and Conflict in Colombia, 4 de novembro de 2021.

[3] Daniel Yovera e Carlos Mauriola, “Yavarí, un corredor de Loreto bajo asedio”, La República, 4 de março de 2024.

[4] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes indígenas, Amazonas (Colômbia), outubro de 2023; líder indígena, Atalaia do Norte, 18 de janeiro de 2024. Para mais informações, ver também Brehaut, “Los Israelitas del Nuevo Pacto Universal en el Perú: religión, deforestación y narcotráfico”, op. cit.

[5] World Drug Report 2023”, Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, 2023.

[6] A produção de um quilograma de cocaína requer mais de 300 litros de gasolina. É comum ver homens em pequenas cidades peruanas transportando barris de produtos químicos pelas principais ruas do vilarejo. Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes indígenas, Amazonas (Colômbia), outubro de 2023.

O assentamento humano também acelerou o desmatamento.

O assentamento humano também acelerou o desmatamento. Um grupo cristão conhecido como Israelitas construiu vários complexos, especialmente no lado peruano da fronteira. Antecipando uma grave seca e fome que, segundo eles, marcará o início do juízo final, a liderança da seita instruiu os seguidores a se estabelecerem na selva. Os colonos desmataram as terras próximas às suas casas, o que os tornou um importante fator no desmatamento.[1]

A extração ilegal de ouro também está contaminando os rios da Amazônia, como o Puré (Purué). As gigantescas dragas de mineração movimentam tantos sedimentos em busca de finas concentrações de ouro que, às vezes, alteram o curso dos rios. Essas máquinas podem custar até US$ 500 mil cada, mas o retorno é tão grande que os operadores recuperam o investimento em poucos meses.[2] Outro efeito alarmante da busca por ouro é o despejo de mercúrio tóxico nos rios e terrenos adjacentes, o que pode causar danos irreversíveis ao sistema nervoso de quem o ingere.[3] Exames de sangue de indígenas que residem ao longo de rios onde operam dragas de mineração registram níveis de mercúrio muito acima do que é considerado seguro.[4]


[1] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes indígenas, Amazonas (Colômbia), outubro de 2023. Para mais informações, ver também Brehaut, “Los Israelitas del Nuevo Pacto Universal en el Perú: religión, deforestación y narcotráfico” op. cit.; e Phillips, “The isolated tribes at risk of illness from Amazon missionaries”, op. cit.

[3] Como regra geral, são necessários pelo menos três gramas de mercúrio para reter um grama de ouro em um amálgama. O uso de mercúrio é comum na dragagem de ouro, apesar de Brasil, Colômbia e Peru terem ratificado a Convenção de Minamata sobre Mercúrio, que o proíbe. Opening the Black Box: Local Insights Into the Formal and Informal Global Mercury Trade Revealed”, IUCN NL, 2021.

[4] “Contenido de Mercurio en comunidades étnicas de la Subregión planicie en la Amazonia Colombiana”, Parques Nacionais Naturais da Colômbia, 2018.

VI. Fortalecendo as respostas ao crime

A. Melhorando a cooperação em segurança

Uma estratégia de segurança eficaz para a região da tríplice fronteira deve incluir no seu cerne os serviços governamentais e de segurança dos três países. Vários esforços de pequena escala para forjar uma maior colaboração já se mostraram frutíferos.[1] A declaração conjunta da cúpula de agosto de 2023 dos oito países amazônicos que formam a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, que se comprometeu a “promover a troca de informações e a cooperação policial e de inteligência, tendo em vista combater atividades ilícitas e crimes ambientais que afetam a Região Amazônica”, poderia dar um impulso muito maior a esses esforços.[2] Notavelmente, propõe a criação de um centro regional de cooperação policial em Manaus. Também em 2023, a Colômbia anunciou um plano para criar outro centro de coordenação em Letícia.[3]

Independentemente de quais novos centros sejam criados, o Brasil, a Colômbia e o Peru deveriam se basear na cúpula de 2023 e promover maior cooperação e compartilhamento de inteligência entre seus órgãos de segurança. É essencial padronizar a legislação sobre crimes ambientais entre os países e utilizar ferramentas tecnológicas, como imagens de satélite, para detectar atividades ilegais, incluindo a operação de plantações de coca e projetos de dragagem ilícitos. Os órgãos judiciários e policiais devem organizar projetos transfronteiriços para fazer cumprir as leis contra a lavagem de dinheiro e o tráfico de narcóticos, madeira, ouro e mercúrio. Essas estratégias devem ser concebidas em colaboração com representantes das comunidades locais, que têm a melhor compreensão de como o crime funciona no local e são os administradores florestais mais competentes da América Latina. (É claro que as autoridades governamentais deveriam primeiro examinar os líderes indígenas para se certificarem de que não tenham entrado em negociações com grupos criminosos.[4])


[1] Pequenos passos – como o destacamento de dois policiais peruanos para as operações brasileiras de combate ao narcotráfico em Manaus e um memorando de entendimento entre Brasil, Colômbia e Peru assinado em 2008 para combater atividades ilícitas em áreas fronteiriças e ao longo de rios comuns – aumentaram a eficácia das patrulhas. Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, autoridades policiais brasileiras e colombianas, 2023.

[2] Criada em 1978, a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica passou por um período de declínio no final da década de 2010. Mas em agosto de 2023, representantes dos oito países amazônicos reuniram-se no Brasil sob os auspícios da organização com o objetivo geral de promover o “desenvolvimento harmonioso dos territórios amazônicos”. A declaração também destacou os riscos enfrentados pelos defensores dos direitos humanos e líderes indígenas e teve como objetivo promover e financiar a proteção e as atividades dos defensores sociais e ambientais na Amazônia. “Get to know the Belem Declaration signed by the Amazon countries at the Summit”, comunicado de imprensa, Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, 9 de agosto de 2023.

[4] O presidente da Colômbia, Petro, priorizou a cooperação com as comunidades locais, inclusive por meio de um projeto piloto estatal para oferecer incentivos financeiros aos residentes para conservar as florestas em áreas afetadas por conflitos. “Forest Governance by Indigenous and Tribal Peoples”, Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, 2021. Daniel Esteban Reyes Espinosa, “‘Conservar Paga’, el incentivo de Ministerio Ambiente para cuidar el Amazonia”, Infobae, 11 de novembro de 2023. No Brasil, uma autoridade falou da necessidade de melhorar o diálogo com as comunidades para que os órgãos estatais possam reagir prontamente às informações e alertas fornecidos pelos representantes comunitários. Entrevista conduzida pelo Crisis Group, autoridade policial, Manaus, 21 de setembro de 2023.

Os governos devem adotar uma abordagem multifacetada para combater a corrupção arraigada e o envolvimento do Estado em atividades ilegais.

Os governos devem adotar uma abordagem multifacetada para combater a corrupção arraigada e o envolvimento do Estado em atividades ilegais, o que tem fomentado a desconfiança mútua entre as forças de segurança que operam na região da tríplice fronteira e dificultado a coordenação entre elas. As autoridades devem reforçar a capacidade dos promotores públicos de investigar crimes ambientais que possam envolver funcionários públicos ou políticos, inclusive fornecendo aos escritórios regionais pessoal suficiente e equipando-os com ferramentas para rastrear fluxos financeiros associados à corrupção. Os funcionários julgados culpados deveriam receber punições suficientemente severas para desincentivarem a outros. Além disso, o estabelecimento de mecanismos de supervisão robustos, como ouvidorias independentes ou órgãos de auditoria externa para monitorar as atividades dos órgãos de segurança pública, pode ajudar a minimizar a corrupção entre essas forças. Por fim, incentivar as comunidades a denunciar a corrupção entre os funcionários públicos que trabalham nos seus territórios é essencial para responsabilizar as forças policiais e criar um sistema mais forte de freios e contrapesos.

As capitais estrangeiras devem perseguir aqueles que têm recursos financeiros e que podem ser responsabilizados por prejudicar a saúde da Amazônia. A União Europeia deveria implementar sua nova estrutura para crimes ambientais, trabalhando com as forças policiais locais e as comunidades indígenas para sancionar os responsáveis pela violação da lei, incluindo o tráfico ilícito de animais selvagem e de mercúrio.[1] A divulgação de informações sobre a extração ilegal de mercadorias como o ouro e a madeira, a qual contribui para a destruição da Amazônia e financia o crime, pode ajudar a identificar os responsáveis pelo financiamento de atividades prejudiciais ao meio ambiente. Da mesma forma, os Departamentos do Tesouro e de Estado dos EUA devem incluir os infratores ambientais na lista do Office of Foreign Assets Control (Gabinete de Controle de Ativos Estrangeiros), permitindo que os bancos globais tomem medidas contra a lavagem de dinheiro por parte desses indivíduos.[2] Os doadores internacionais também deveriam fornecer recursos e assistência técnica às unidades de inteligência financeira que operam em nível nacional e regional na Colômbia, no Brasil e no Peru, para que possam seguir melhor os rastros de dinheiro ilícito e permitir que as sanções sejam direcionadas de forma mais eficaz.


[1] Environmental crimes: Deal on new offences and reinforced sanctions”, comunicado de imprensa, Parlamento Europeu, 16 de novembro de 2023. A imposição de sanções ambientais tem sido limitada até à data, ocorrendo quase inteiramente na Ásia.

[2] Entrevistas telefônicas conduzidas pelo Crisis Group, funcionários públicos dos EUA e especialistas em lavagem de dinheiro, maio de 2024.

O pequeno porto em Islandia, Peru. Janeiro de 2024. CRISIS GROUP / Bram Ebus

B. Meios de subsistência e defesa da comunidade

Todos os três países fronteiriços deveriam abordar as condições socioeconômicas que levam os residentes a se juntarem a grupos criminosos. Eles poderiam, por exemplo, considerar a possibilidade de reunir recursos e esforços para levar serviços estatais a áreas transfronteiriças, incluindo clínicas móveis – com pessoal qualificado para ajudar sobreviventes de violência baseada no gênero – e escolas que pudessem alcançar pessoas em locais remotos onde é improvável que instalações permanentes sejam construídas. As respostas a emergências causadas pelo clima, como enchentes, secas e incêndios florestais, seriam mais eficazes se as equipes transnacionais também pudessem operar além das fronteiras e contar com o financiamento das três capitais e de doadores estrangeiros. Ao mesmo tempo, as autoridades dos três países devem estar conscientes do potencial impacto que novas políticas públicas podem ter sobre os meios de subsistência das pessoas que vivem na área. Embora a proteção do ecossistema seja crucial, reprimir as economias de subsistência sem fornecer caminhos alternativos para o emprego legal poderia levar mais pessoas a se envolverem em atividades criminosas.

Essas tensões precisam ser tratadas com cuidado especial na demarcação de mais terras coletivas indígenas nessa região. A demarcação pode ajudar a capacitar as comunidades indígenas a se defenderem daqueles que querem usar o seu território para atividades ilícitas.[1] Os títulos de terras coletivos reconhecem a relação única que os grupos indígenas têm com a terra. Eles também conferem às comunidades o direito à autodeterminação e à defesa das suas práticas culturais.[2] Portanto, juntamente com a demarcação dos territórios, existe um arcabouço jurídico que reconhece a autoridade das estruturas de governança indígena sobre a terra (a forma específica depende do país ou da etnia). Esse reconhecimento legal capacita as comunidades em suas interações com o Estado, incluindo a polícia ou as forças armadas, que são legalmente obrigadas a salvaguardar seus direitos coletivos e fornecer proteção.


[1] Os líderes indígenas têm criticado abertamente o presidente brasileiro Lula da Silva, que prometeu acelerar a demarcação de terras coletivas em sua campanha, mas não cumpriu o prometido durante seu primeiro ano de governo. Indigenous Brazilians lament Lula’s unfulfilled land demarcation promises”, Common Dreams, 19 de abril de 2024.

[2] Todos os países latino-americanos são signatários da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, a qual reconhece os direitos coletivos das comunidades indígenas. Este tratado, juntamente com a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas de 2007, que reconheceu o direito desses povos à autodeterminação, é a base jurídica da exigência de direitos coletivos à terra. Os Povos Indígenas na América Latina: Avanços na última década e desafios pendentes para a garantia de seus direitos”, CEPAL, novembro de 2014.

As iniciativas de demarcação de mais terras indígenas devem levar em consideração a presença e as necessidades de outras pessoas que podem entrar na órbita do crime organizado.

Dito isso, as iniciativas de demarcação de mais terras indígenas devem levar em consideração a presença e as necessidades de outras pessoas que podem entrar na órbita do crime organizado se não lhes for permitido exercer seus meios de subsistência. Grupos não indígenas, como os ribeirinhos, também poderiam receber direitos adicionais à propriedade da terra e ao uso de recursos por meio de títulos coletivos ou comunitários, desde que estes sejam complementados por regulamentações ambientais apropriadas que incentivem atividades favoráveis à floresta.

Enquanto isso, nas vastas extensões da Amazônia, órgãos de segurança pública terão dificuldade em reforçar a sua presença a menos que estabeleçam laços fortes com as comunidades. A população local está melhor posicionada para detectar quando grupos violentos representam uma ameaça ao seu território e pode alertar as forças de segurança sobre quaisquer movimentos suspeitos.[1] Para este fim, os países e seus parceiros estrangeiros também deveriam apoiar os guardas indígenas que surgiram em resposta a incursões criminosas.[2] Sozinhas, é pouco provável que essas redes informais, geralmente desarmadas, sejam capazes de afastar intrusos que portem armas. Mas os órgãos de segurança pública deveriam ser encorajados a criar laços com esses grupos e a agir com base nas informações que fornecem, em vez de rejeitarem os seus pedidos de assistência, como acontece com frequência atualmente.


[1] Entrevistas conduzidas pelo Crisis Group, líderes indígenas, Amazonas (Colômbia), outubro de 2023.

[2] Os guardas indígenas têm sido eficazes na defesa dos seus territórios na Colômbia, mas encontraram maior resistência em outros locais, incluindo no Brasil e no México. Pueblos indígenas latinoamericanos en la mira del narcotráfico y la insurgencia”, IWGIA, 8 de abril de 2022. “In Brazil, Indigenous Ka’apor take their territory’s defense into their own hands”, Mongabay, 14 de março de 2022.

VII. Conclusão

Grupos criminosos estão enchendo seus cofres às custas da floresta amazônica e das populações que ela abriga. Para as comunidades espalhadas pela área da tríplice fronteira, essas organizações oferecem emprego, mas também causam enorme desconforto, uma vez que perpetram a violência, poluem a terra e os cursos d'água e reivindicam ilegitimamente uma parte do território. O desmatamento nesta zona fronteiriça não atingiu os extremos observados em outras partes da floresta tropical. No entanto, a fraqueza das autoridades locais e a forma como os grupos criminosos em expansão reforçam uma combinação de violência que leva a mortes, colapso comunitário e danos ambientais levantam questões urgentes sobre se os três países podem honrar os compromissos que assumiram para proteger a biodiversidade da Amazônia e o seu papel essencial como reguladora do clima global.

Essas questões estarão na vanguarda dos principais eventos internacionais que abordam os desafios ambientais globais: a COP16 da Biodiversidade em Cali, Colômbia, em outubro de 2024; a Cúpula do G20 que o Brasil sediará em novembro de 2024; e a COP30 do Clima, que se reunirá em Belém do Pará, na Amazônia brasileira, em novembro de 2025. Os países presentes nessas reuniões devem tomar cuidado para não fazer grandes promessas de proteger o meio ambiente sem também abordar as condições de base na Amazônia e os efeitos corrosivos que o crime, os meios de subsistência ilícitos e a corrupção estatal podem ter sobre a possibilidade de concretizar as promessas verdes.

Os esforços conjuntos de policiamento liderados pelos países amazônicos e apoiados por parceiros estrangeiros serão cruciais para forçar os grupos criminosos a recuar. Em regiões que são difíceis de governar – onde o transporte é pouco frequente e caro e os órgãos estatais geralmente possuem orçamentos inferiores aos do crime organizado – as autoridades locais precisarão colaborar mais estreitamente com as comunidades, enquanto os moradores necessitarão de melhor acesso a empregos legais para evitar que se juntem a grupos criminosos. Os líderes mundiais que buscam mobilizar essas cúpulas para proteger a Amazônia para a humanidade não devem perder de vista o crime que se alastra na floresta tropical.

Bogotá/Bruxelas, 17 julho de 2024

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